SUPERPODER FEMININO
Arte de Fatturi
Só
a mulher tem a liberdade de se sentir ofendida e se retirar a qualquer
momento de qualquer local. Ela tem um passe-livre da mágoa. Uma pulseira
vip do camarote da tristeza. O homem não. O homem nem pensar.
Eu invejo esse superpoder. É uma habilidade sobrenatural, muito melhor
do que os dois braceletes indestrutíveis da Mulher-Maravilha, que repele
balas e raios, ou de sua tiara que funciona como bumerangue. Sua
namorada pode estar conversando com você num bar, de uma hora para outra
fechar a cara e deixá-lo plantado na cadeira.
Ela evaporará da
multidão sem explicar nada. Você herdará a caipirinha de morango ainda
cheia. Terá que ir atrás dela. Pagar a conta e ir atrás dela. Pagar a
conta, retirar seu carro do estacionamento e ir atrás dela.
Não
entenderá o que aconteceu para gerar a atitude intempestiva. Mas ela é
que tem razão. Foi você que disse algo que a desagradou profundamente.
Uma palavra áspera, uma grosseria involuntária, uma falta de gentileza
são suficientes para abandoná-lo.
Por se ver sempre culpado, o
homem corre igual a uma ovelha no encalço de sua pastora. Como não
compreende o desaparecimento, conclui que é um idiota. Além de ferir,
tampouco percebeu que feriu. Duplamente consternado por não conter a
agressividade e não se dar conta dela.
Todo sujeito se
desespera. Não tem tempo de pensar e voa em direção ao pedido de
desculpa. Ela não facilitará as pazes: em prantos, desligará o celular,
não permitirá que entre em casa e dirá que não quer mais falar com você.
Nenhum marmanjo resiste a ser esquecido em público: é a flechada derradeira do cupido.
Já fui largado em cinema, teatro, balada, pub, shopping, boliche. E
nunca permaneci parado, atirei-me à rua para reavê-la. Bate um medo da
fúria feminina, do que ela pode cometer quando consternada.
Responsabilizo-me por eventual fatalidade. Esquecerei pudores e cuidados
com a reputação. Gritarei “me espera!” na Padre Chagas lotada, vou
subir o velocímetro na Ipiranga (não há maior perseguição policial do
que entre dois motoristas apaixonados e brigados).
Já o homem
não desfruta desse direito. Se abandonar sua companhia no meio de um
compromisso, mesmo com a realidade a seu favor, ele é um estúpido, um
mau caráter, um boçal.
Será visto como um covarde pelo resto do
relacionamento. Como que ele leva uma convidada para um lugar e não sai
do estabelecimento acompanhado dela?
O sofrimento masculino tem a obrigação de ser educado.
Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, Caderno Donna, p. 6
Porto Alegre (RS), 10/03/2013 Edição N° 17367
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